Nos idos de 2001, me lembro de estar assistindo a um dos últimos episódios de Dragon Ball Z, pouco antes do almoço, e da hora de ir para a escola, e só uma sensação dominava meu pequeno corpo de criança: incerteza.
Naquela altura do anime, a maior ameaça já enfrentada por Goku – o herói da história – era Majin Boo, um monstro rosa que sempre se adaptava num corpo mais novo e mais forte e parecia indestrutível.
Nos episódios anteriores, tudo já havia sido tentado pelos sayajin, mas nada funcionava. Até que fomos introduzidos ao conceito de Genki Dama.
A Genki Dama consistia basicamente na união de toda a energia positiva de todos os seres vivos na Terra concentradas numa esfera cósmica que Goku manuseava com muito esforço. O herói estabeleceu uma conexão quase espiritual com os seres vivos dentro e fora da tela – quem não levantou os braços para cima para ajudar o Goku não assistiu direito! – e estabeleceu que não há ser mais poderoso do que todos os seres unidos.
A Genki Dama fica gigantesca, é arremessada contra Majin Boo, o bem vence, o mal perde. Fim da história.
O que uniu os povos naquele episódio foi a ameaça em comum, algo que todos queriam evitar, algo que precisava ir embora de nossas vidas.
Tal metáfora pode ser aplicada a diversas situações e períodos da nossa história. Mas o que está em voga atualmente é o BBB e as atitudes e opiniões nocivas de alguns participantes.
Dentre eles, o mais agressivo é a rapper Karol Conká, que aterrorizou psicologicamente o participante Lucas “Koka” Penteado que saiu do programa devido a pressão psicológica e falta de aceitação dentro da casa.
A internet se uniu quase que imediatamente para rechaçar o comportamento destrutivo e maldoso de Karol Conká e debates sobre saúde mental e convivência em sociedade tomaram conta das redes sociais durante semanas.
A condenação das falas da participante têm total validez e, seja o BBB um produto de massa pensado inicialmente para alienar o público ou não, as discussões que o programa levanta são legítimas e chegam em lugares que artigos acadêmicos talvez jamais chegariam.
E Karol está no paredão. As pesquisas parciais indicam que ela sairá com o maior número de rejeição da história do programa. E é tudo legítimo, importante de ser visto e ouvido. Mas muito se confunde quando falamos sobre a união do povo por um mal em comum e a condenação de atitudes numa vitrine.
O que vimos em Dragon Ball Z foi um vilão fictício representando o mal para o mundo e sendo derrotado pela união dos que escolheram a vida. O que vemos no BBB é a condenação de comportamentos nocivos para a saúde mental das pessoas sendo excluído pela união dos que escolhem o cuidado entre as pessoas.
Então por que é que o mesmo não acontece na política? Por que é que quando debatemos votos, vemos ataques pessoais e “perdão” para falas e atitudes odiosas de políticos que claramente não se importam com o povo?
Para terminar…
A didática de um anime é simples, roteirizada para ser abrangente e conquistar todos os públicos. A didática de um reality-show é pensada exclusivamente para causar identificação.
Na política não existe didática simples, as leis não são simples, as brechas na constituição não são de fácil compreensão, mas a facilidade da manipulação de discursos para mascarar atitudes destrutivas é assustadoramente simples.
A vitrine pela qual vemos a política é outra, pois ela não é feita para alcançar lugares e pessoas que estão à margem, não há abrangência no pensar político atual. E isso dificulta uma pesquisa sobre nível de rejeição ou uma conexão que forme um poder capaz de destituir vilões.
Porque a Karol Conká não tem o poder de condenar um povo com loucos e incompetentes em cargos vitais para a nação e o Majin Boo não pode nos fazer mal enquanto ganhar vida pela mão de desenhistas e animadores.
Então bora curtir nossos animes, bora vibrar com o BBB, mas que a verdadeira luta não seja esquecida e que as lições certas sejam aprendidas com esses acontecimentos midiáticos.
Somos mais fortes juntos, nos ensinamos a aprender e a ensinar, podemos derrotar quem nos faz mal. Bora?